“É livre a manifestação do pensamento e da expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, sendo vedado o anonimato. (CF 88).”

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Incúria, inércia, desídia?

A  Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de  1990,  dispõe sobre o Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis da União, das Autarquias e das Fundações Públicas Federais. No Capítulo I –  dos Deveres – o  Art.  116  determina que o servidor deverá  exercer com zelo e dedicação as atribuições do cargo e  administrar diligentemente a  economia do material e a conservação do patrimônio público. O Art. 117, XV, proíbe a conduta desidiosa.
A Lei Complementar n0 133 de 31 de dezembro de 1985  que estabelece o Estatuto dos Funcionários Públicos do Município de Porto Alegre, no Art. 196 – Capítulo II, normatiza os Deveres; entre eles:  V – desempenhar, pessoalmente com zelo e presteza os encargos que lhe competirem e os trabalhos de que for incumbido, dentro de suas atribuições; VII – observar as normas legais e regulamentares; VIII – representar ou comunicar a seu chefe imediato irregularidades de que tiver conhecimento no órgão em que servir; XIV – manter coleção atualizada de leis, regulamentos e demais normas necessárias ao desempenho de suas atribuições; XV – zelar pela economia e conservação do material que lhe for confiado; XVII – sugerir providências tendentes ao aperfeiçoamento do serviço. Parágrafo único –  Será considerado como co-autor o superior hierárquico que, recebendo denúncia ou representação a respeito de irregularidades no serviço ou de falta cometida por funcionário, seu subordinado, deixar de tomar as providências necessárias a sua apuração.
No Capítulo III – Das Proibições, temos: II – retirar, modificar ou substituir, sem prévia permissão da autoridade competente, qualquer documento ou objeto existente na repartição; XXIII – cometer a pessoas estranhas à repartição, fora dos casos previstos em lei, o desempenho de encargos que competir a si ou a seus subordinados.
Vários autores  explicam a desídia como a ação contrária à de diligência, do bom desempenho e do zelo, que constituem requisitos justificadores da presença do servidor público no serviço. Portanto, a desídia  “é sinônimo de negligência, relaxamento, descaso e incúria” (GUIMARÃES, 1998, p. 33).  Significa negligência, desleixo, descaso, indolência, inércia, preguiça, etc. “De efeito, infere-se que procede de modo desidioso o servidor público que desenvolve a sua função com negligência, desleixo e incúria.” (COSTA, 2004, p. 397).  “Desídia, em sentido técnico, está interligado ao desleixo, à desatenção, à indolência com que o servidor público executa as funções que lhes estão afetas” (MATTOS, 2006, p. 573).
O empregado labora com desídia no desempenho de suas funções quando o faz com negligência, preguiça, má vontade, displicência, desleixo, indolência, omissão, desatenção, indiferença, desinteresse e relaxamento. A desídia pode também ser considerada “um conjunto de pequenas faltas, que mostram a omissão do empregado no serviço, desde que haja repetição dos atos faltosos” (MARTINS, 2003, p. 358).
O servidor  público tem como obrigação a execução e prestação de um serviço eficiente. Deixar de cumprir sua tarefa com zelo – que pode ocorrer pela ausência da conduta necessária ao seu cumprimento ou pela prática desse ato de forma insuficiente e defeituosa –, poderá  produzir  uma sequência de ações prejudiciais à eficiência do serviço público, inclusive, onerando-o.
 Nos documentos da Prefeitura Municipal de Porto Alegre   aos quais tive acesso, verifiquei diversos atos de  negligência, displicência, desleixo, indolência, omissão  e desatenção.
O procedimento administrativo sob n0 1.102348.99.5.000 é um exemplo de desídia que já foi amplamente demonstrada.
O economista Henrique Cándano Peixoto, matrícula 57.303.0, lotado na Secretaria da Fazenda, acompanhou e elaborou  toda a documentação desse procedimento administrativo de compra e venda e perpetrou muitos erros.  Comprar de forma direta, sem licitação, não é prática normal do Município de  Porto Alegre, segundo Cándano,   mas como  a Secretaria de Educação manifestou urgência na negociação,  ele geriu  todo o procedimento. Pergunto por que um economista foi  cedido ao Município para essa transação?  E por que essa compra era tão emergencial que dispensou os trâmites normais  para um negócio desse porte?  Tudo foi feito tão às pressas que não faltaram a displicência, o desleixo, a omissão, a  desatenção e o relaxamento.   Tanto o Estado quanto o Município possuem vários prédios e áreas abandonadas que poderiam ser usados para instalar escolas e serviços comunitários.
Acredito ter havido desídia, também, na lavratura da escritura pública posto que ao tabelião cabe “apreciar, em negócios imobiliários, a prova dominial.”  E também “aconselhar, com imparcialidade e independência, a todos os integrantes da relação negocial, instruindo-os sobre a natureza e as conseqüências do ato que pretendem realizar”. 
Em http://www.tjrs.jus.br/legisla/cojers.php  – Seção II das Atribuições – Subseção I dos Tabeliães encontrei os seguintes artigos:

Art. 127 - Integra a atividade notarial, no plano profissional:
I - avaliar a identidade, capacidade e representação das partes;
II - aconselhar, com imparcialidade e independência, a todos os integrantes da relação negocial, instruindo-os sobre a natureza e as conseqüências do ato que pretendem realizar;
III - redigir, em estilo correto, conciso e claro, os instrumentos públicos, utilizando os meios jurídicos mais adequados        à obtenção dos fins visados;
IV - apreciar, em negócios imobiliários, a prova dominial.
Art. 128 - O Tabelião, como autor do instrumento público, não está vinculado a minutas que lhe forem submetidas, podendo revisá-las ou negar-lhes curso.
Art. 129 - É facultado ao Tabelião realizar, ante repartições públicas em geral e registros públicos, todas as gestões e diligências necessárias ou convenientes ao preparo ou à eficácia dos atos notariais.
Art. 135 - O Tabelião que infringir os deveres de seu ofício responderá pessoalmente por todos os danos a que der causa.

Na matrícula do imóvel já constava o registro das duas penhoras, e o contrato de compra e venda não havia sido registrado. E mais, no ato da escritura não havia registro de transferência de posse da  Administração de Imóveis Princesa do Lar para Agropastoril Santa Márcia.
Portanto, o tabelião poderia( e deveria ) ter se negado a escriturar o imóvel.


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Displicência, indiferença, desinteresse,  desleixo, omissão,  desatenção, relaxamento não faltam também nos atos jurídicos propostos pelo Município.  O Processo Cível nº 10504066408 apresentou falhas contra o bom desempenho, à boa diligência e ao zelo. 
Pude constatar a repetição  da desídia no processo de Execução Fiscal que o Município de Porto Alegre moveu contra a Agropastoril Santa Márcia S/A, através da  8ª Vara da Fazenda Pública do Foro Central 1/1, sob o nº 10504412896 e com propositura em 30/08/2004:
1.  No Executivo Fiscal n0  54137/2004, datado em 12 de agosto de 2004 e assinado pelo procurador Giovani Kerber Jardim,  o Município indica o mesmo endereço que consta no contrato de compra e venda: Rua Demétrio Ribeiro, n0  01000. No Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica da Receita Federal,  encontramos: Rua Demétrio Ribeiro, nº  990 sala 203. Os dados do representante legal não estão preenchidos.
2.  Mas a  Certidão de Dívida Ativa nº  54138 contém falhas. Ela é gerada em nome de Agropastoril Santa Márcia S.A.,  indicando a sede na rua Demétrio Ribeiro nº 01000, entretanto, a servidora pública Mari Enoi da Silva e Silva, matrícula nº  494690, que elaborou e assina a Certidão de Dívida Ativa, e o chefe da Unidade de Arrecadação, Carlos Alberto Fonseca de Oliveira, que autentica o documento, estabelecem que “o valor provém da incidência de IMPOSTO PREDIAL E TAXA DE COLETA DE LIXO sobre o imóvel sito na DEMÉTRIO RIBEIRO NRO. 00254, no Município de Porto Alegre, com inscrição municipal no  1246216, estando discriminado na anexa ‘memória de cálculo’, como parte integrante desta Certidão.” (sic) 
3.  Ora, o nº 254, como já vimos, é do prédio penhorado, sito na rua Jerônimo Coelho, esquina com Marechal Floriano Peixoto.  Então, de qual imóvel estava sendo cobrado o imposto predial e a taxa de coleta de lixo?  Esse erro grave fez com que todas as diligências do cartório tivessem como endereço o nº 254, inexistente na rua Demétrio Ribeiro.
4.  Em 28 de setembro de 2005, o escrivão substituto, Ademir Moreira da Silva, certifica “que os presentes autos/petição de fls., foram recebidos em Cartório, na data de 27/08/2005, não sendo, porém, protocolada na data referida, por absoluta falta de tempo, face ao volume excessivo de petições/processos recebidos do Município de Porto Alegre na data de 27/08/2005”.
5.  Acredito que o Município de Porto Alegre diminuiria o número de petições/processos e congestionaria menos o Judiciário se todos os servidores fossem mais atentos e zelosos  no seu trabalho.
6.  Em 16 de outubro de 2006, a Juíza de Direito Fabiana Zilles, expede Mandado de Citação, Penhora e Intimação – Execução. Orientada pelo endereço onde recai o valor da dívida, a Oficial de Justiça Beatriz Gewehr realiza a diligência, mas não encontra o prédio indicado pelo Município.
7.  Em outubro de 2006,  a Agropastoril Santa Márcia S.A. já havia mudado seu tipo jurídico para Ltda., e o Município de Porto Alegre realizado a averbação da escritura do prédio 254 da Jerônimo Coelho. 
8.  A propositura da ação de execução ocorreu em 30/08/2004. A escritura do prédio 254  teve registro em cartório no dia 29/09/2004.  Somente em janeiro de 2007, a Procuradora do Município de Porto Alegre, Márcia Moura Lameira,  fornece à 8ª Vara da Fazenda Pública do Foro Central o novo endereço constante do cadastro da Receita Federal, para  o cumprimento do mandado de citação, penhora e intimação.
9.  Em 05/07/2007, o Município de Porto Alegre, por seu Procurador Laerte Marta de Oliveira, requer baixa e arquivamento do feito, em razão  do “cancelamento do executivo fiscal”, sem maiores explicações.
10.            Esse cancelamento foi feito mediante a quitação da dívida? Ou por algum outro acordo?  Não seria mais transparente ter um acordo homologado em juízo?


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“É preciso entender que as leis servem apenas para orientar a nossa convivência, como sociedade. Mas nosso comportamento como pessoas depende de nossos valores, do uso de nosso discernimento e da nossa liberdade. Não dependemos de governos, partidos e líderes para sermos honestos e verdadeiros. Os valores morais é que nos mostram o caminho do bem e da verdade, são eles que impedem o ser humano de praticar atos ilícitos. Quando não são importantes na vida das pessoas, não há sistema que impeça um lamaçal de corrupção e de maldades.

Caráter, consciência, amor à verdade e ao próximo, generosidade, fidelidade, responsabilidade, respeito ao alheio, senso de justiça, são essas as virtudes que comandam a vida pública. Abandoná-las é decisão pessoal. Toda culpa é pessoal. Ela é decorrente do mau uso da liberdade. A culpa é tão intransferível quanto as virtudes. Nossa luta é convencer nosso povo a se comportar de acordo com essa visão ética. Por isso devemos sempre querer que os culpados sejam punidos.” (Sandra Cavalcanti, professora e jornalista, foi deputada federal constituinte.- O Estado de S.Paulo)

http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,os-culpados--devem-ser-punidos-,798388,0.htm