“É livre a manifestação do pensamento e da expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, sendo vedado o anonimato. (CF 88).”

domingo, 4 de dezembro de 2011

Os magistrados e a roupa que o rei (não) vestiu

“Talvez por isso, jogar a toga na bancada tem um significado profundo, mesmo para um ministro nomeado por Castelo Branco. Tem sentido vestir uma toga que te deixa nu?”
“O ministro Adauto Lúcio Cardoso não se revoltou contra a lei de censura prévia. Até mesmo porque ela já estava instalada no Brasil e não havia motivo para tal indignação. A revolta do ministro, e os debates demonstram isso claramente, era contra uma decisão a ser proferida pelos seus colegas do STF que restringia seus poderes. Em outras palavras, Adauto se revoltou contra a possibilidade da Corte Suprema do país decidir que não tinha o poder de decidir sobre a guarda constitucional. É como se com aquela decisão todos os ministros estivessem tirando suas togas e guardando no armário.”

O Supremo Tribunal Federal e o regime militar de 1964
Ivan Furmann*

Durante o regime militar iniciado em 64, as características da Corte Suprema do país se modificaram devido ao cerceamento efetivado pelo poder executivo. Estudar esse período é essencial para imaginar as possibilidades do STF como defensor da democracia, do Estado de Direito e da Constituição.
RESUMO: O Supremo Tribunal Federal sofreu profundas modificações durante o regime militar que se iniciou 1964. A partir do AI-2 ocorreram mudanças significativas no número de integrantes e no quadro de ministros. Durante esse tempo, aos poucos, as características da Corte Suprema do país se modificou e devido ao cerceamento efetivado pelo poder executivo. Assim o STF perdeu em grande medida sua força e mesmo cooptado ao regime militar exerceu papel secundário diante do autoritarismo instalado. O momento mais significativo nesse sentido foi quando um de seus membros se revolta e supostamente joga a toga na bancada em protesto contra seus colegas que decidiram a favor da restrição de suas próprias funções. Repensar esse período é essencial para imaginar as possibilidades do STF em tempos em que se aprende a viver a democracia no Brasil ou, ao menos, se aprende a repensar o papel da Corte Suprema brasileira como defensora do Estado de Direito e da Constituição.
1. A receita para uma crítica histórica

1.1 Uma colher de fantasia

O famoso conto do dinamarquês Hans Christian Andersen, chamado “A roupa nova do rei” serve aqui como chave simbólica para o momento em que o STF encarou o seu maior desafio histórico na tentativa de manutenção do Estado de Direito.

A história de Andersen narra as desventuras de um rei muito vaidoso que acabou enganado. Como se preocupava muito com a aparência o rei sempre buscava novidades da moda, até que um dia dois malandros chegam em seu reino com o relato de um tecido nunca dantes visto. Diziam-se responsáveis por tecer uma malha única, além de ser a mais bela de todas conhecidas, continha o dom de impedir pessoas estúpidas ou incompetentes para o cargo que ocupassem de a visualizarem. Assim a malha pareceria invisível aos incapazes. Curioso o rei manda um de seus ministros ver tal malha, o qual, com medo de ser considerado estúpido por nada ter enxergado, retorna com o relato do tecido mais belo do mundo. O rei então, na companhia de dois cortesões, se dirige aos embusteiros. No encontro sua majestade não enxerga o tecido, porém acaba mentindo para manter as aparências, principalmente em relação a sua capacidade como rei. Os cortesões, replicando a falsidade, sugerem que seja feita uma nova roupa para o rei com aquele tecido para um desfile. Sem discordar o rei encomenda a roupa e envia fios de ouro e seda para complementar o traje bem como um farto pagamento aos tecelões impostores. Chegado o dia do desfile, todo o povo sabe sobre os ditos poderes do tecido. Após o rei se vestir com sua nova roupa, os enganadores fogem sem que ninguém perceba. Então começa o desfile do rei com a roupa imaginária. Tudo corria bem e ninguém do povo ousava a autoproclamar-se estúpido. Até que uma criança resolveu gritar:

Coitadinho, está nu! O rei está nu!
É quando todo o povo em coro grita:
- O rei está nu! O rei está nu!
Sem perder a pose o rei termina o desfile sobre as risadas de todo o povo, para depois ficar alguns anos sem aparecer em público de vergonha.

1.2 Uma xícara de simbólico

E ele jogou a toga sobre a bancada de julgamento. Era preferível estar nu a vestir ela, pensou o Ministro Adauto Lúcio Cardoso.

O único a rebelar-se publicamente contra os militares foi Adauto Lúcio Cardoso: em 1971, vencido numa votação contra a censura, ele retirou-se intempestivamente do plenário durante a sessão de julgamento. Celso de Mello, o que mais sabe sobre a história da corte, não confirma que Adauto Lúcio Cardoso tenha jogado a toga sobre a bancada ao se retirar. (CARVALHO, L. MAKLOUF, 2010a)

A votação referida pelo jornalista é o da reclamação 849, de 10 de Março de 1971. (Os acalorados debates da decisão podem ser vistos na integra no site do STF  http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=87519). Tal reclamação motivou inclusive o pedido de aposentadoria do ministro Adauto Lúcio Cardoso, que se indignou com a decisão que atribuía ao Procurador Geral da República a competência exclusiva de encaminhar ou não as ações de inconstitucionalidade ao STF. A reclamação foi encaminhada pelo MDB e rejeitada por maioria, sendo contrário à rejeição apenas Adauto Cardoso. Tal acontecimento é confirmado por Evandro Lins e Silva e Leda Boechat Rodrigues.

Em 1971, o STF julgou constitucional a lei da censura prévia, editada pelo Governo Médici. Vencido o Ministro Adauto Lúcio Cardoso manifestou sua indignada repulsa diante daquela decisão, despiu sua capa. atirou-a em sua curul e abandonou acintosamente o recinto. Todos os jornais, no dia seguinte, deram grande cobertura ao ocorrido, inédito na vida do STF. Evandro comenta que o gesto de Adauto foi teatral, mas diz que tal reação depende do temperamento de cada um. "A verdade, parece-me, é que a atitude do Ministro Adauto Lúcio Cardoso foi única, continua única, e provavelmente nunca se repetirá". Foi, assim, muito valioso o depoimento do Ministro Evandro Lins e Silva ao CPDOC, publicado com o título de O Salão dos passos perdidos. (RODRIGUES, 2002, p. 480).
Desse episódio vale destacar dois equívocos. O ministro Adauto Lúcio Cardoso não se revoltou contra a lei de censura prévia. Até mesmo porque ela já estava instalada no Brasil e não havia motivo para tal indignação. A revolta do ministro, e os debates demonstram isso claramente, era contra uma decisão a ser proferida pelos seus colegas do STF que restringia seus poderes. Em outras palavras, Adauto se revoltou contra a possibilidade da Corte Suprema do país decidir que não tinha o poder de decidir sobre a guarda constitucional. É como se com aquela decisão todos os ministros estivessem tirando suas togas e guardando no armário.

Durante o regime militar de 1964 a toga do STF foi aos poucos se transformando. Aliás, vale ressaltar que toga é a vestimenta obrigatória dos ministros até hoje.

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Ivan Furmann*
Doutorando em Direito pela UFPR. Mestre em Educação. Bacharel em Direito. Professor de Direito e História do Centro Universitário Curitiba (Unicuritiba)
O conceito de Direito
Daniele Comin Martins


INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como objetivo fazer um breve levantamento sobre o conceito de direito a partir da da Teoria do Direito, da Sociologia do Direito e da Filosofia do Direito.

A proposta é de um diálogo entre estas disciplinas a fim de se atingir o objetivo maior, que é o de se entender a problemática um torno das definições e conceituações do direito. Sabemos que não existe um único conceito ou uma única idéia de direito e, desse modo, propomos uma análise capaz de compreender o motivo pelo qual isto ocorre, bem como suas implicações.

Inicialmente apresentamos as mais comuns acepções da palavra direito, a fim de alertar o leitor para o imenso leque de possibilidades de interpretação do termo.

Posteriormente é que entramos no debate mais árduo, realizando uma breve incursão no pensamento de três expoentes do positivismo jurídico: Kelsen, Hart e Bobbio, buscando entender como eles trabalharam o tema e conceituaram o direito.

Numa terceira etapa de reflexão apresentamos a proposta de Roberto Lyra Filho, cuja formulação perpassa a Sociologia e a Filosofia do Direito, buscando compreender o fenômeno jurídico como um processo dialético, superando todos os modelos apresentados até então.

Por fim, apresentamos alguns apontamentos que a Teoria Crítica realizou em torno do tema, ponderações reflexivas e de profunda crítica de um movimento que se propõe não apenas a analisar o fenômeno jurídico, mas também de influenciá-lo a partir de uma práxis emancipadora.

Esta é a proposta, que, sem dúvida alguma não esgotará um tema tão vasto e complexo, mas que dará algumas noções sobre a problemática que circunda algo que parece elementar, mas que esconde uma profundidade e complexidade que poucos temas possuem.
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“É preciso entender que as leis servem apenas para orientar a nossa convivência, como sociedade. Mas nosso comportamento como pessoas depende de nossos valores, do uso de nosso discernimento e da nossa liberdade. Não dependemos de governos, partidos e líderes para sermos honestos e verdadeiros. Os valores morais é que nos mostram o caminho do bem e da verdade, são eles que impedem o ser humano de praticar atos ilícitos. Quando não são importantes na vida das pessoas, não há sistema que impeça um lamaçal de corrupção e de maldades.

Caráter, consciência, amor à verdade e ao próximo, generosidade, fidelidade, responsabilidade, respeito ao alheio, senso de justiça, são essas as virtudes que comandam a vida pública. Abandoná-las é decisão pessoal. Toda culpa é pessoal. Ela é decorrente do mau uso da liberdade. A culpa é tão intransferível quanto as virtudes. Nossa luta é convencer nosso povo a se comportar de acordo com essa visão ética. Por isso devemos sempre querer que os culpados sejam punidos.” (Sandra Cavalcanti, professora e jornalista, foi deputada federal constituinte.- O Estado de S.Paulo)

http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,os-culpados--devem-ser-punidos-,798388,0.htm