“É livre a manifestação do pensamento e da expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, sendo vedado o anonimato. (CF 88).”

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Judiciário Gaúcho erra mais uma vez

Sombras no caminho

Embora envolvendo as mesmas partes, os acórdãos abaixo são referentes ao processo de execução   nº 0106261366  (dano moral) ajuizado em 01/03/2001  contra a empresa Agropastoril Santa Márcia S.A. (a propositura da inicial foi anterior à alienação).  O auto de penhora sobre o imóvel em discussão  foi lavrado em 11/07/2001. Posteriormente, em 15/01/2004, foi averbada a penhora, sendo levada a registro em 12/03/2004.
Assim, o registro da segunda penhora ocorreu  quando o imóvel era, ainda, de fato e de direito, de propriedade da Agropastoril Santa Márcia S.A./Organização Imobiliária Princesa do Lar S.A./Princesa do Lar S.A./Administração de Imóveis Princesa do Lar S.A.[1], pois a escritura foi registrada somente em 30/09/2004. Portanto, “poderia o imóvel ser legal e regularmente penhorado por qualquer credor da proprietária”, segundo parecer do desembargador Osvaldo Stefanello.  
Em demanda no Primeiro Grau, os   embargos foram julgados improcedentes, em 11/07/2005 – processo 001/1.05.0267809-0.
A Promotora de Justiça, Vera Lúcia da Silva Sapko, entendeu  que a constrição do bem deveria ser mantida, prosseguindo a execução.
 o imóvel foi vendido, diretamente, pela própria empresa executada ao Município, sendo evidente a intenção do devedor de fraudar a execução, já que sabia ser este seu único bem livre, tornando-se, com a venda, insolvente”. “A conduta fraudatória do devedor, de resto, restou plenamente reconhecida na sentença de fls. 96/101 e no acórdão de fls. 103/110, os quais reconhecem a fraude, com fulcro no art. 593, inciso II, do Código de Processo Civil, tornando a venda ineficaz perante o juízo da execução”. (...) “Note-se que o Município, no caso, não agiu com o cuidado que lhe era exigível, adquirindo bem de empresa que já estava sendo executada, e, mais, sem tomar o cuidado de registrar  o compromisso de compra e venda entabulado[2] (...) “O município, em relação ao que se presume a boa  fé, correu riscos – sequer buscou certidões negativas em relação à vendedora, o que é estranhável tratando-se de ente público –, devendo, agora, assumir as conseqüências de sua aquisição imprudente”. “O que não pode é penalizar a embargada, que adotou todas as cautelas devidas  para a cobrança de seu crédito, só não tendo realizado o registro da penhora com maior antecedência em decorrência dos trâmites processuais e, não, de sua desídia.

A juíza substituta, Márcia Kern Papaleo,  ponderou:

Há que se salientar que o contrato de compra e venda firmado entre o Município e a executada Agropastoril Santa Márcia S.A. somente foi registrado em 30/09/04, segundo o documento acostado na fl. 145. Portanto, inexistindo registros imobiliários na época em que se registrou a penhora em questão, ou seja, em 12/03/04 (fl. 145 ), tal contrato não era oponível contra terceiros”. “Sobre o tema, vale mencionar a lição de josé carlos barbosa moreira in  O novo Processo Civil Brasileiro, 22. ed., Rio de Janeiro, Forense, 2004, p.200:
A coisa pode não ser encontrada nas mãos do  devedor, por havê-la este alienado. Se a alienação  tiver ocorrido depois que a coisa se tornara litigiosa, e a pretensão do credor se fundar em direito real, a hipótese é de fraude à execução. Em tal caso, muito embora possa valer entre o devedor e o terceiro adquirente, o ato de alienação é ineficaz em face do credor, de modo que o bem continua sujeito à execução, como se ainda integrasse o patrimônio do devedor.

***

Apesar de meu  direito ser reconhecido  pelos magistrados de Primeiro Grau, os desembargadores  da Sexta Câmara Cível, com exceção de um voto vencido, defenderam outro entendimento. Ainda que a segunda penhora tivesse  sido  registrada quando  o bem permanecia na posse do  vendedor, pois o Município não havia providenciado no registro do compromisso de compra e venda e tampouco registrado  a escritura –  o que ocorreu seis meses após –, não tive sucesso em Segundo Grau, como demonstram os acórdãos abaixo. 

***
“EMBARGOS DE TERCEIROS. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA NÃO REGISTRADO. PENHORA POSTERIOR DO IMÓVEL. TERCEIRO DE BOA FÉ”.
“Comprovado que o imóvel penhorado foi objeto de contrato de promessa de compra e venda, firmado antes do ajuizamento da ação executiva, e cercando-se o adquirente das cautelas devidas para o negócio em espécie, considera-se de boa-fé o promitente comprador.
A publicidade da penhora só ganha efeito contra terceiro depois do respectivo registro.
A ausência do registro do contrato de promessa de compra e venda do imóvel no assento imobiliário não afeta o negócio realizado entre comprador e vendedor, permanecendo o contrato válido e eficaz entre as partes.
Apelação provida por maioria, vencido o Revisor que negava provimento.
                                                                            

APELAÇÃO CÍVEL
SEXTA CÂMARA CÍVEL
Nº 70013035852
COMARCA DE PORTO ALEGRE
MUNICIPIO DE PORTO ALEGRE - APELANTE
LENI BEATRIZ SCHMITZ - APELADO
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Sexta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, por maioria, dar provimento à apelação, vencido o Revisor que negava provimento.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Osvaldo Stefanello (Presidente) e Des. Artur Arnildo Ludwig.
Porto Alegre, 21 de dezembro de 2006.
DES. ANTÔNIO CORRÊA PALMEIRO DA FONTOURA, Relator
RELATÓRIO
Des. Antônio Corrêa Palmeiro da Fontoura (RELATOR)
Trata-se de apelação interposta pelo MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE contra sentença (fls. 164-171) que julgou improcedentes os embargos de terceiros ajuizados em face da execução movida pela ora embargada LENI BEATRIZ SCHMITZ contra AGROPASTORIL SANTA MÁRCIA S/A.
Em suas razões recursais, sustentou o apelante que, em 14.12.1999, firmou com a executada contrato de promessa de compra e venda, tendo como objeto o imóvel que foi alvo da penhora que pretende desconstituir.
Afirmou que em 1º.03.2001, a ora apelada LENI BEATRIZ SCHMITZ ajuizou ação de execução (processo nº 0106261366) contra a empresa AGROPASTORIL SANTA MÁRCIA S.A, sendo lavrado, em 11.07.2001, auto de penhora sobre o imóvel objeto da promessa de compra e venda acima referida, imóvel este que já estava sendo ocupado pelo embargante. Posteriormente, em 15.01.2004, foi averbada a penhora, sendo levada a registro em 12.03.2004.
Esclareceu que antes disso, em julho de 2000, já havia sido registrada uma outra penhora sobre o imóvel adquirido pela municipalidade, em razão da ação de execução autuada sob nº 01197232877. Naquela oportunidade foram interpostos embargos de terceiros pelo Município, julgados improcedentes em ambos os graus de jurisdição, sendo interposto recurso especial, ainda pendente de julgamento.
Referiu que a ação de execução em que foi determinada a penhora que visa desconstituir é posterior à celebração do contrato de promessa de compra e venda.
Seguiu relatando que em 30.09.2004 foi levado a registro a escritura definitiva de compra e venda.
Sustentou que a ausência de registro do contrato de promessa de compra e venda não pode ser óbice a afastar sua pretensão, pois está buscando proteger a sua posse. E, mais, já está pacificado na doutrina o entendimento acerca da impossibilidade de a penhora de imóvel não inscrita no álbum imobiliário estender seus efeitos ao terceiro adquirente do imóvel.
O fato de que já havia uma penhora incidente no imóvel, também registrada posteriormente à promessa de compra e venda, decorrente de outra relação processual não interfere na conclusão de que no presente caso não houve fraude à execução.
Foram apresentadas contra-razões (fls. 188-207).
O Ministério Público opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 212-215). É o relatório.
VOTOS
Des. Antônio Corrêa Palmeiro da Fontoura (RELATOR)
Eminentes Colegas.
Busca o apelante a desconstituição da segunda penhora realizada sobre imóvel que adquiriu através de contrato de promessa de compra e venda não registrado.
É fato incontroverso nos autos que o embargante, em 14.12.1999, firmou contrato de promessa de compra e venda de imóvel de propriedade de AGROPASTORIAL SANTA MÁRCIA S/A, contrato este não levado a registro, vindo, posteriormente, a ser penhorado o referido imóvel.
Também não há discussão a respeito do fato de que o referido imóvel foi objeto de duas penhoras, decorrentes de processos de execução distintos, ajuizados pela ora embargada contra a AGROPATORIL SANTA MÁRICA S.A.
Analisando os autos, constata-se que a primeira execução (processo nº 01197232877, fl. 49)[3] foi ajuizada em 1997, sendo a penhora realizada em 30.06.1997 (fl.43) e registrada em 21.07.2000 (fl. 115).
A segunda execução (processo nº 0106261366), foi ajuizada em 1º.03.2001 (fl. 47), sendo a penhora realizada em 11.07.2001 (fl. 45) e registrada em 12.03.2004 (fl. 116).
A primeira penhora sobre o referido imóvel já foi objeto de discussão nos embargos de terceiros (processo nº 0107555345, Apelação Cível nº 70005384938) hoje pendente de julgamento do Recurso Especial nº 682512.
Os presentes embargos de terceiro têm como objeto a desconstituição da segunda penhora.
Analisando os autos, constata-se que quando realizada a compra e venda, em 14.12.1999, não havia qualquer gravame registrado sobre o bem, sequer tinha sido distribuída a ação de execução que deu origem à penhora objeto dos presentes embargos.
Verifica-se, ainda, que o embargante tomou as devidas cautelas exigidas para os negócios em espécie, conforme se observa dos documentos de fls. 21-25, buscando informações acerca do imóvel através de certidões negativas de débito.
Cabe destacar, ainda, que nos autos não há notícia de quando o embargante tomou conhecimento da primeira penhora. O único dado que se pode apurar é que os primeiros embargos de terceiros foram distribuídos em 08.08.2001 (fl. 48).
Dessa forma, demonstrada restou a boa-fé do embargante.
Por outro lado, a publicidade do registro da penhora é indispensável para que surta eficácia contra terceiros, conforme dispõe a regra do artigo 659 do Código de Processo Civil. Logo, sendo os registros posteriores à aquisição, ou seja, 21.07.2000 e 12.03.2004, o bem se encontrava livre e desembaraçado de qualquer ônus.
Neste sentido, precedentes desta Corte:
“EMBARGOS DE TERCEIRO. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL ADQUIRIDO ANTES DO AJUIZAMENTO DA EXECUÇÃO NÃO LEVADA A REGISTRO. INEXISTÊNCIA DE FRAUDE”. Os elementos dos autos demonstram, com suficiência, a posse e propriedade dos embargantes sobre o imóvel penhorado, e o fato de não estar registrada no ofício imobiliário não acarreta a validade da constrição judicial recaída sobre referido bem. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70010501534, Décima Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ana Beatriz Iser, Julgado em 23/02/2005).
“EMBARGOS DE TERCEIROS. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DO BEM FIRMADO EM DATA ANTERIOR AO AJUIZAMENTO DA EXECUÇÃO E ALIENADO POSTERIORMENTE AOS EMBARGANTES.  POSSE DE BOA FÉ, SUSTENTADA EM JUSTO TÍTULO, MERECE PROTEÇÃO. SÚMULA 84 DO STJ. FRAUDE À EXECUÇÃO E FRAUDE A CREDORES NÃO CARACTERIZADAS”.
APELAÇÃO DESPROVIDA.
(Apelação Cível nº 70012512018, 20ª Câmara Cível, Rel. Des. JOSÉ AQUINO FLÔRES DE CAMARGO, j. 09.11.2005)
“EMBARGOS DE TERCEIRO. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. BOA FÉ. EFEITOS. FRAUDE À EXECUÇÃO. INOCORRÊNCIA”.
O embargante que adquire imóvel, em data em que o registro imobiliário do bem não indicava qualquer restrição à venda, deve ser considerado de boa fé.
Não basta o ajuizamento de ação contra o devedor. É indispensável a publicidade da penhora do bem, mediante o respectivo registro de imóveis. Atuais precedentes do STJ. Sem tal providência, aquele que adquirir o bem presume-se não ter conhecimento da pendência de processo capaz de conduzir o executado em insolvência. Só a partir da publicação da restrição judicial, mediante inscrição no Registro Imobiliário é que se admite venha a atingir terceiros.
APELO E RECURSO ADESIVO NÃO PROVIDOS
(Apelação Cível nº 70008946287, 16ª Câmara Cível, Rel.Des. CLAUDIR FIDELIS FACCENDA, j. 23.06.2004)
“EMBARGOS DE TERCEIRO. PROCESSUAL CIVIL. CONTRATO DE COMPRA E VENDA. AUSÊNCIA DE REGISTRO. PENHORA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 84 DO STJ. ENTEDIMENTO PACÍFICO QUE O COMPRADOR, QUE TEM A SUA POSSE AMEAÇADA, PODE DEFENDÊ-LA POR MEIO DE EMBARGOS DE TERCEIRO, MESMO QUE O CONTRATO DE COMPRA E VENDA NÃO TENHA SIDO REGISTRADO, COMO É O CASO EM TELA. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ DOS APELADOS – COMPRADORES – E DO EXECUTADO, TENDO EM VISTA QUE O CONTRATO DE COMPRA E VENDA FOI CELEBRADO EM 28/02/1992 E AÇÃO EXECUTIVA MOVIDA APENAS EM 17/10/2000. CUSTAS PELO EMBARGADO, EIS QUE DEU CAUSA AOS PRESENTES EMBARGOS E NÃO RECONHECEU O PEDIDO DOS EMBARGANTES”.
APELO DESPROVIDO.
(Apelação Cível nº 70011625894, 13ª Câmara Cível, Rela. Desa. ANGELA TEREZINHA DE OLIVEIRA BRITO, j. 23.03.2006)
Quanto à ausência de registro do contrato de promessa de compra e venda, tal fato não importa em viciar o negócio entabulado entre as partes. O contrato permanece válido e eficaz e, encontrando-se o embargante na posse do imóvel, é de ser reconhecido o direito real de aquisição do bem penhorado.
Sobre este ponto, filio-me ao entendimento do Superior Tribunal de Justiça, que deu origem à Súmula nº 84, no sentido de que ”é admissível a oposição de embargos de terceiros fundados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda do imóvel, ainda que desprovido do registro”.
Não há que se falar também em fraude à execução, o que, necessariamente, ensejaria a declaração de ineficácia do negócio jurídico realizado entre o embargante e a executada.
Para o reconhecimento da fraude à execução, é indispensável que a alienação dos bens ocorra no curso da ação executiva, o que não aconteceu no caso concreto, pois esta (processo nº 0106261366) foi ajuizada em 1º.03.2001, depois de realizada a compra e venda do imóvel em discussão.
Por tais fundamentos, dou provimento ao recurso, e julgo procedentes os embargos de terceiros, ao efeito de desconstituir a segunda penhora registrada sobre o imóvel matriculado no Registro de Imóveis da 1ª Zona de Porto Alegre, sob nº 114.831, datada de 12.03.20004.
Diante da procedência dos embargos de terceiros, inverto os ônus sucumbenciais.
É o voto.
Des. Artur Arnildo Ludwig (REVISOR)
Peço vênia ao ilustre Relator para divergir da posição adotada.
Inicialmente cumpre referir que muito embora envolvendo as mesmas partes, a presente ação se refere a processo executivo distinto daquele em que o imóvel em comento também foi objeto de penhora.
Naquele processo os embargos de terceiro foram improcedentes, sendo mantida a decisão em segundo grau e estando pendente de julgamento o recurso interposto perante o STJ.
Muito embora o processo de execução aqui discutido tenha sido interposto em 2001 (resultando na segunda penhora que recaiu sobre o imóvel), não há como dissociá-lo daquele que já foi objeto de decisão, considerando-se apenas as questões de ordem processual que, se aplicadas distintamente, de fato direcionariam este feito a um juízo de procedência em prol do apelante.
No entanto, entendo que na hipótese dos autos, não há como afastar a penhora que recaiu sobre o imóvel adquirido pelo Município sob o argumento de que este teria sido adquirente de boa-fé.
A boa-fé ainda que presumida, exige do adquirente – sob a ótica do homem médio - que não tenha condições de saber da possibilidade concreta de que o imóvel possa vir a ser expropriado em virtude de dívidas adquiridas pelo vendedor do bem.
Apesar de também comungar do entendimento de que a penhora deve ser registrada para que o negócio produza seus efeitos perante terceiro, na hipótese específica dos autos, não é crível que se trabalhe com a hipótese de que o Município, antes de efetuar o negócio de compra e venda do imóvel, não conhecesse a existência do primeiro processo executivo movido contra a empresa vendedora, que foi ajuizado em 1997, principalmente quando se observa que diligenciou perante outros órgãos a fim de se resguardar da possível existência de dívidas envolvendo o vendedor. Ainda mais porque se está a falar de um imóvel que custou à Municipalidade mais de um milhão de reais.
Ainda que à época da venda a primeira penhora não estivesse registrada, bastava uma simples leitura dos autos do primeiro processo interposto (1997) para se observar que tal fato não ocorreu por demora no trâmite processual, pois a autora foi diligente na busca da perfectibilização de tal registro.
Assim, embora nesta ação possam estar presentes os pressupostos processuais para que se reconheça a desconstituição da penhora, pois foi ajuizada em 01.03.2001, posteriormente ao negócio realizado em 1999 entre o apelante e a empresa executada, tal entendimento não seria o mais acertado.
Isso porque não se pode fechar os olhos para o fato de que o presente imóvel já vinha sendo objeto de penhora em outra ação, que teve os embargos de terceiro julgados improcedentes, ainda que pendentes de julgamento em sede de Recuso Especial, e que deixar de reconhecer o direito da autora, levando-se em conta apenas “datas”, sem deixar de observar o conjunto dos fatos, seria colocar o direito processual acima do direito material, já que o conjunto dos autos dá conta de que a manutenção da penhora parece ser a mais acertada.
Assim é que tenho que diante das peculiaridades deste caso concreto, o apelo da municipalidade deve ser desprovido.
É o voto.
Des. Osvaldo Stefanello (PRESIDENTE)
A ação de embargos de terceiro objetiva assegurar a posse do bem. No caso, a posse do município sobre o imóvel advém de regular contrato. Portanto, posse real e legítima, eis que não vejo vício na sua origem ou no decorrer de seu exercício, desimportando que o contrato não houvesse sido averbado antes da penhora levada a efeito em favor da embargada.
Com estas breves ponderações, estou em acompanhar  o voto do eminente  Relator, provendo o apelo do município de Porto Alegre.
DES. OSVALDO STEFANELLO - Presidente - Apelação Cível nº 70013035852, Comarca de Porto Alegre: "DERAM PROVIMENTO AO APELO POR MAIORIA, VENCIDO O REVISOR QUE NEGAVA PROVIMENTO."

Julgador(a) de 1º Grau: MARCIA KERN PAPALEO

  21/12/2006 "TOMADO O VOTO FALTANTE, RESTOU O SEGUINTE RESULTADO: DERAM PROVIMENTO, POR MAIORIA, VENCIDO O REVISOR, QUE NEGAVA PROVIMENTO."
 
***

·                             O relator, desembargador  Antonio Corrêa Palmeiro da Fontoura, argumenta que “encontrando-se o embargante na posse do imóvel, é de ser reconhecido o direito real de aquisição do bem penhorado”. Curiosa, fui pesquisar o significado de “direito real”. Consultando o Novo Código Civil, encontrei no  Art. 1.417: “Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel.” Lendo esse artigo, entendi que o titular de direito real à aquisição é aquele que registrou, na serventia de registro de imóveis, o instrumento de promessa de compra e venda em que não se pactuou arrependimento.
·                            * No compromisso entre Nelson Silveira e o Município de Porto Alegre não houve pacto de arrependimento, mas o documento deixou de ser registrado no Cartório de Registro de Imóveis. Portanto, a transação não atendeu ao referido artigo.  Onde está o direito real do qual fala o desembargador?
·                             O Art. 1.227 reporta-se aos  direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, que   “só se adquirem com o registro no Cartório de  Registro de Imóveis dos referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos neste Código”.
·                             Já o Art. 1.247 estipula que “Se o teor do registro não exprimir a verdade, poderá o interessado reclamar que se retifique ou anule”. Parágrafo único: “Cancelado o registro, poderá o proprietário reivindicar o imóvel, independentemente da boa-fé ou do título do terceiro adquirente.” No capítulo 23, veremos por que esse artigo poderá ser empregado.
·                             O desembargador também argumenta que “Para o reconhecimento da fraude à execução, é indispensável que a alienação dos bens ocorra no curso da ação executiva”. Foi exatamente nesse período que ocorreu a alienação – “o que ensejaria a ineficácia do negócio”, segundo Antônio C. Palmeiro da Fontoura.
 ________________ 

 * aceito críticas, correções e sugestões.



[1] Na data da alienação, o imóvel não pertencia à Agropastoril Santa Márcia S.A., como veremos  posteriormente.
[2]  O Município também não realizou o registro logo após a compra, em 1999 (e não foi por falta de dinheiro), o que ocorreu somente em 2004.
[3] Partes desse Processo: Princesa S/A Condomínios Locações Vendas – executada ; advogado Marco Antônio Birnfeld; Leni Beatriz Schmitz, exequente; advogado Nélson Vasconcelos. Encontrados no endereço eletrônico: http://www.tj.rs.gov.br/site_php/consulta/consulta_processo.php?id_comarca=porto_alegre&num_processo=106261366&code=8393

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Leia
Desembargador muda voto mas é vencido


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“É preciso entender que as leis servem apenas para orientar a nossa convivência, como sociedade. Mas nosso comportamento como pessoas depende de nossos valores, do uso de nosso discernimento e da nossa liberdade. Não dependemos de governos, partidos e líderes para sermos honestos e verdadeiros. Os valores morais é que nos mostram o caminho do bem e da verdade, são eles que impedem o ser humano de praticar atos ilícitos. Quando não são importantes na vida das pessoas, não há sistema que impeça um lamaçal de corrupção e de maldades.

Caráter, consciência, amor à verdade e ao próximo, generosidade, fidelidade, responsabilidade, respeito ao alheio, senso de justiça, são essas as virtudes que comandam a vida pública. Abandoná-las é decisão pessoal. Toda culpa é pessoal. Ela é decorrente do mau uso da liberdade. A culpa é tão intransferível quanto as virtudes. Nossa luta é convencer nosso povo a se comportar de acordo com essa visão ética. Por isso devemos sempre querer que os culpados sejam punidos.” (Sandra Cavalcanti, professora e jornalista, foi deputada federal constituinte.- O Estado de S.Paulo)

http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,os-culpados--devem-ser-punidos-,798388,0.htm