“É livre a manifestação do pensamento e da expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, sendo vedado o anonimato. (CF 88).”

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Um parecer tendencioso: perito enfatiza assédio para negar o nexo

As vezes penso que essa palavra “assédio”  foi a chave que  me fechou todas as portas: da justiça do trabalho, da cível quanto ao nexo, do INSS e da imprensa, porem abriu a porta pela qual o Município de Porto Alegre teve acesso à compra do prédio penhorado. 
 Laudo do perito:

Nome do Segurado: LENI BEATRIZ SCHMITZ
NOME DA EMPRESA: JORNAL DO COMÉRCIO
CP: 99384/180 data da visita 05.01.99

Em atendimento a OS/DSS 251 de 18.03.93, visitamos a empresa supra citada com o objetivo de fazer análise de funções e avaliar o ambiente de trabalho, visando o estabelecimento de nexo técnico em relação às Doenças Profissionais e as do Trabalho.
Realizamos a visita nas instalações do Jornal do Comércio situada na Avenida João Pessoa número 1282, com as presenças das seguintes pessoas, além deste Médico Perito do INSS.
Dr. Dirceu Rodrigues – Médico do Trabalho da Empresa
Sr. Celso Miguel Lovato – Chefe do RH da Empresa
Sr. Léo Flores Vieira Nunes – Representante do Sindicato dos Jornalistas, identificado mediante Fax da Ata de posse da Diretoria do Sindicato datada de 28.04.98, enviado por nossa solicitação, uma vez que no momento de sua apresentação não tinha memorando algum que o identificasse como membro do referido Sindicato.
data da emissão da cat: 16.09.98 – CAT SINDICATO
data da admissão na empresa: 01.04.86
data da demissão:

Aviso prévio remunerado oferecido em 12.09.95 tendo como último dia de trabalho a data de 11.09.9526. Como a funcionária se recusou a assinar o Aviso Prévio, foram obtidas assinaturas de duas testemunhas.
ASOs:
A Empresa não possui documentação referente a Atestados Médicos Admissional, Periódicos ou Demissional, nem ficha clínica dessa funcionária, pois os mesmos se encontram na GEBEMED que era, na ocasião, a empresa responsável pelos exames médicos.27 
Contatamos com a GEBEMED que através de seu Diretor Médico - Dr. Thierry deverá fornecer-nos aceso aos dados de prontuário.28 
jornada de trabalho: variável. Em torno de oito horas/dia.29 Tinha por obrigação fechar de uma a quatro páginas do jornal com matérias a seu encargo.
profissão/função: jornalista – editora “A”30
descrição da atividade:
Segundo informações da própria segurada a mesma realizava suas tarefas na posição sentada quando digitava as matérias em máquinas de escrever mecânicas tipo Remington e ocasionalmente atendia o telefone na posição de pé, para entrevistar pessoas. Circunstancialmente anotava informações manualmente na sala da diretoria.31 
Tinha como tarefas editar de uma a quatro páginas do jornal, tendo uma determinada hora programada para ser encerrada a edição.

descrição do ambiente do trabalho:

Redação do JC antes
dos computadores
O ambiente do trabalho atualmente executado é bastante diferente, segundo informações da própria segurada, daquele no qual trabalhou. Não existiam naquele tempo os terminais de computador, nem as cadeiras giratórias tipo “giroflex”. Trabalhava com máquinas de escrever mecânicas e sentava-se em cadeiras de quatro pés, com assento estofado que agora estão deslocadas para a sala dos Recursos Humanos onde iniciamos nossa entrevista.
O pé direito do prédio de alvenaria é bastante alto (cerca de seis a oito metros).
A temperatura ambiente não é muito confortável, não havendo ar condicionado na ampla redação do jornal, onde trabalham duas dezenas de pessoas, mas apenas ventiladores.
Os terminais de computador localizam-se em mesas de altura adequadas, mas não apresentam tela de proteção. Os teclados se assentam em pequenas mesas de trabalho onde não há adequado apoio para os antebraços e não observamos apoios para os pés dos redatores.

agentes físicos:
ruído: não significativo
CALOR: existente
Iluminação: adequada

fatores ergonômicos:
Trabalho físico leve, Jornadas sem hora determinada para terminar, sendo necessário completar as matérias que constituirão a edição do dia seguinte, repetitividade estimada face aos movimentos de datilografia embora não houvessem indicações de determinado número de toques por minuto, ferramentas de trabalho adequadas ao momento histórico da empresa (era pré-computador)

observações:

Face inexistir no momento atual as condições ergonômicas de trabalho alegadas pela segurada, devido modificações decorrentes do desenvolvimento das empresas jornalísticas com instalação de terminais de computador substituindo máquinas de escrever mecânicas, tivemos que entrevistar a segurada e sua chefia que ainda se encontra presente no jornal, pois a maioria de seus colegas de trabalho não mais atuam na redação atual. Os únicos remanescentes seriam um redator que a segurada não quis que o entrevistassem para não prejudicá-lo (sic) perante a direção do jornal, e o ex-chefe o Sr. Roberto Brenol de andrade.
O Sr. renato32  se dispôs a falar conosco, mas não aceitou fazê-lo na presença da segurada pois segundo nos informou desgastou-se bastante com a mesma, durante os tempos seguintes a um processo que a mesma impetrou contra o jornal, oportunidade na qual, segundo o Dr. Renato33, a mesma se utilizava de um gravador para intimidar as pessoas entrevistadas, e o importunava pessoalmente ligando para sua residência.
            Segundo ainda o Sr. Renato34, a segurada em questão teve problemas financeiros para custear uma cirurgia decorrente de uma fratura de membro superior, não relacionada ao trabalho, tendo se iniciado uma coleta de numerário na empresa para ajudá-la a custear tais despesas. Segundo informações do mesmo, em pouco tempo tal coleta, passou a se constituir em argumentação da segurada como se fosse uma espécie de pagamento para cessar uma acusação de assédio de natureza não bem definida, sendo sustado imediatamente.

Doença básica/sintomas/achados significativos

Segurada refere sintomas álgicos nos membro superiores e inferiores desde 1988 (cerca de dois anos após sua admissão na Empresa).
Realmente, observando-se seu extenso AMP e dados existentes na Perícia Médica sobre seu caso, verificamos que a mesma teve ao longo de seus tratamentos inúmeros diagnósticos, tendo consultado diversos médicos a saber:

Tenossinovite de ombro esquerdo – fls. 01 do processo
Tendinite de perna direita – fls. 01 do processo
Síndrome Miofascial – fls. 01 do processo
Bursite de ombros – fls. 01 do processo
LER Grau III – fls. 02 do processo
Fratura de membro superior esquerdo – fls. 05 do processo
Dores em todo o corpo – fls. 07 do processo
Dor cervical – fls. 07 o processo
Dor lombar – fls. 07 do processo
Dores membros inferiores ( no plural) fls. 07 do processo
Dores cervicais com irradiação para MSD – fls. 07 do processo
Dores nas coxas desde a região glútea – fls. 07 e 11 verso do processo
Dores generalizadas, pior nas pernas – fls. 13 verso
Dores no pescoço – fls. 07 do processo
Dores de cabeça – fls. 07 do processo
Tonturas ao deitar – fls. 07 do processo
Dores generalizadas – fls. 07 do processo
Dores em todo o corpo – fls. 11 do processo
Pseudoartrose cubital (decorrente de uma fratura em 1994)35 

Médicos que diagnosticaram e trataram:

Dr. Antonio Castilhos – fls. 01 do processo36
Dra. Maria da Graça Hoefel37  - fls. 01 e 04 do processo
Dr. Quintanilha – fls. 07 do processo
história cronológica das doenças

Segurada refere dores diversas por todo o corpo desde 1988. Mais precisamente em 24.11.88 o Dr. Quintanilha descreve em seu prontuário médico como queixa principal: “QP: Dores em todo o corpo”. – vide fls. 11 do processo. Esta observação documentada por médico estranho à empresa entre outras constantes no processo dá a exata dimensão da problemática desta segurada que não apenas não tinha queixas específicas com relação aos membros superiores, como localiza suas queixas álgicas em todo o corpo, o que bem demonstra a possibilidade mais provável de uma doença não relacionada ao trabalho,  conhecida por suas dezenas de pontos álgicos e denominada Síndrome Miofascial, que é uma das hipóteses diagnosticadas de seus médicos, doença esta que acomete fundamentalmente mulheres.
A par de causas físicas ainda não bem definidas esta segurada teve um processo de divórcio em 1988/89 que certamente a abalou bastante sob o ponto de vista emocional, podendo o quadro álgido inclusive ser conseqüência destes conflitos manifestados por possível somatização.
Não existem causas laborais que produzam dores generalizadas como se observa em diversas manifestações documentadas no processo.
De outra parte as manifestações emocionais desta segurada são bastante significativas, indicando uma instabilidade que ainda não está adequadamente compensada, pois além dos problemas que teve na empresa com o Dr. Renato38 (já descritos) pessoalmente conosco, médico-perito do INSS foi agressiva e intolerante, quando tentou certa vez forçar um exame médico-pericial quando não apresentava documento de identidade para podermos identificá-la adequadamente, conforme consta às fls. 5 verso do processo.
De outras feitas fez insistentes contatos com o número de nosso celular que obteve, pressionando-nos fora do local de trabalho a dar opiniões que só poderíamos fazer no processo.
Paralelamente ao quadro álgico disseminado, teve problemas decorrentes de uma fratura de antebraço esquerdo, complicada com pseudoartrose, patologia esta nada relacionada ao trabalho, mas que deseja colocar no processo, alegando que teve que trabalhar com imobilizações com receio de ser demitida pelo empregador.
Ingressou na justiça contra a empresa, sendo avaliada por médicos perito judicial em 12.09.97, documento no qual o colega – Dr. Laércio Mendes Ouriques39 refere:
- dores na coluna cervical e membros inferiores. Entretanto, na ocasião não realizou nenhum tratamento médico
- ao nosso ver não se observa nenhuma seqüela de doença adquirida  no trabalho.

laudo ergonômico

Segurada anexou ao processo laudo ergonômico encomendado pela empresa onde se observam, de fato, inúmeros problemas no “lay out” das instalações, fatos estes trazidos ao processo tendem a demonstrar que a empresa tinha problemas que poderiam explicar sua condição clínica.
Analisamos o laudo, mas não conseguimos correlacionar suas queixas e doenças apresentadas com agravos do trabalho, além do que, indagada por nós a própria segurada informa que trabalhavam com ela na redação mais de vinte colegas e só se lembra de uma delas, de nome Tânia Barrero, ter apresentado problemas semelhantes aos seus, indicando uma única incidência mínima, pelo que os possíveis fatores agravantes do trabalho não se faziam corresponder ao aparecimento de doenças.

conclusões sobre o nexo técnico

Decorrente dessa visita realizada a Empresa, dos achados recolhidos do processo em que a segurada solicita transformação de benefício previdenciário (B 31) para benefício acidentário, além do fato de termos pessoalmente examinado a segurada em questão, concluímos que suas patologias não guardam relação com a atividade de jornalista – repórter -  editora, mas que suas doenças básicas são decorrentes de situações da vida em geral tais como fratura de membro superior esquerdo complicada com pseudo-artrose, síndrome miofascial e importante quadro de instabilidade emocional, fragilizada que ficou pelo divórcio ocorrido, no qual ficou incumbida de prover sua prole. Tanto receio tinha de perder  seu meio de sustento que resolveu trabalhar com tipóia sem ter solicitado afastamento por doença e mesmo tendo a aquiescência da Empresa para fazê-lo (a empresa poderia te-la impedido de exercer suas atividades, bastando que o médico da empresa atestasse sua inadequada condição física) mesmo assim trouxe a nós reivindicações desta situação.
a base técnica desta conclusão pode ser obtida do verso da CAT Denominada LEM (Laudo  de Exame Médico) existente no verso das fls. 60 do processo, assinado pela médica Dra. Maria da Graça Hoefel, onde se lê no quadro 2 – descrição das lesões –
“paciente com sindrome miofascial confirmada pelo exame clínico através de pontos dolorosos determinados pelo americamcollegy of rheumatology.”
A seguir afirma que: “nexo confirmado com o trabalho”. Aqui a Dra. faz uma afirmação temerária. No diagnóstico provável socorre-se de outro diagnóstico para dar força sua argumentação, incluindo o diagnóstico de LER grau 3 sem consubstanciá-lo, até porque LER não é um diagnóstico de uma doença específica, mas de uma denominação generalizada, existindo cerca de vinte doenças relacionadas ao termo LER que, aliás, na data em que a LEM foi assinada pela Dra. Hoefel, tal denominação já estava em desuso e já se denominava estas  situações de DORT (Doença Osteomuscular Relativas ao Trabalho). No entanto, ainda hoje se necessita do diagnóstico específico, e não apenas da sigla generalizadora.
Segurada muito prejudicada emocionalmente, chorou bastante no início da entrevista, quando o médico do trabalho da empresa a questionava para se inteirar dos fatos passados, pois só recentemente é médico da empresa, além de pessoalmente termos presenciado suas instabilidades emocionais com intolerância e insistência descabidas no Posto Partenon. 

Com base neste conjunto de informações concluímos não haver  nexo técnico  entre o trabalho e as doenças apresentadas pela segurada.

Dr. Paulo Gonzaga
Médico Perito – INSS/RS


Este relatório, visando  ao estabelecimento de nexo técnico,  tem vários itens a serem  contraditados e, para facilitar o entendimento, irei numerá-los.
1. No item “data de demissão”, o perito afirma: “Como a funcionária se recusou a assinar o Aviso Prévio, foram obtidas assinaturas de duas testemunhas”. Temos aqui uma “afirmação” pessoal de Paulo Gonzaga visto que o perito não  colocou que era “informação” do Departamento de RH. O perito já iniciou seu trabalho julgando meu comportamento, o que  irá se repetir até o final do seu relatório.
2. Na conversa que manteve com meu ex-chefe, o perito não perguntou como era o ambiente no qual eu trabalhei, em relação à ergonomia. Pergunta alguma relacionada à forma como eu executava meu trabalho, se eu me queixava da altura das cadeiras e mesas, ou se eu me queixava de dor.
3. Porém, desviou-se da finalidade da visita e anotou uma acusação gravíssima, feita por Roberto Brenol, ao  escrever em seu relatório: “a mesma se utilizava de um gravador para intimidar as pessoas entrevistadas, e o importunava pessoalmente ligando para sua residência”. Essa afirmação inverídica diz respeito à minha conduta profissional como jornalista. Gravar as entrevistas e intimidar as fontes é atitude que requer puniçãoO representante do Sindicato dos Jornalistas presenciou a conversa e aceitou o que foi dito sem qualquer questionamento.
4. Não bastando, o perito anotou a informação de que tive problemas financeiros  e foi iniciada uma coleta na empresa para me ajudar, porém “em pouco tempo tal coleta, passou a se constituir em argumentação da segurada como se fosse uma espécie de pagamento para cessar uma acusação de assédio de natureza não bem definida, sendo sustado  imediatamente”.
Questões fortes nesse relatório de visita são colocadas com o intuito de me desqualificar, o que igualmente ocorreu no judiciário. Porém, nessa ação, mencionada por Roberto Brenol, o julgador estava despido “de qualquer condição machista” para perceber “que a violência do requerido prosseguiu na demanda mercê de sua marcante tentativa de desqualificá-la como pessoa digna de buscar resguardo no judiciário, porquanto veio com o argumento de que Leni se vale de ações judiciais para buscar valores para sua mantença, mas esquece que a discussão foi colocada em termos aceitos socialmente (demanda judicial), que o móvel seria uma vingança pela despedida imotivada(...)”.
5. O perito Paulo Gonzaga deduziu que todo o meu problema era emocional e atribuiu a “um processo de divórcio em 1988/89 que certamente a abalou bastante sob o ponto de vista emocional, podendo o quadro álgico inclusive ser conseqüência destes conflitos manifestados por possível somatização”.
Ora, se o perito Paulo Gonzaga acredita que conflitos emocionais possam gerar um quadro álgico, por que não questionou Roberto Brenol sobre a “acusação de assédio de natureza não bem definida”?  Essa situação referida foi bem definida e  aceita nos tribunais. Realmente os julgadores entenderam que “o fato perdurou de 1988 até 1994 (...). Inclusive ficaram seqüelas emocionais, conforme tratamento psiquiátrico  que se submeteu.”
6. Outra colocação importante a observar é a afirmação: “Tanto receio tinha de perder seu meio de sustento que resolveu trabalhar com tipóia sem ter solicitado afastamento por doença, e mesmo tendo a aquiescência da Empresa para fazê-lo (a Empresa poderia tê-la impedido de exercer suas atividades, bastando que o médico da empresa atestasse sua inadequada condição física) mesmo assim trouxe a nós pessoalmente reivindicações desta situação)”.
O perito não me perguntou o porquê de todo o meu receio em perder o emprego. Não perguntou por que “resolvi” trabalhar sem pedir auxílio do INSS, mesmo após uma cirurgia em que colocara placa metálica, fio de Kirschner e ainda gesso.
Aqui é importante  observar algumas alegações do perito do INSS:
 a) No início do relatório, o perito afirma que “A empresa não possui documentação referente a atestados Médicos Admissional, Periódico ou Demissional, nem ficha clínica desta funcionária, pois os mesmos se encontram na GEBEMED que era, na ocasião, a Empresa responsável pelos exames médicos. Contatamos a GEBEMED que através de seu Diretor Médico – Dr. Thierry deverá fornecer-nos acesso aos dados de prontuário”.
 b) A visita ao JC foi agendada pelo INSS com antecedência, tanto que um médico do trabalho estava lá no momento e também o representante do Sindicato dos Jornalistas. Tempo suficiente para que o médico Dirceu Rodrigues solicitasse o meu prontuário na GEBEMED.
 c)  O relatório foi feito sem que o perito tivesse em mãos meus exames admissional, demissional e periódicos, porque nunca foram feitos.
7. O perito analisa o laudo ergonômico, mas não consegue  correlacionar minhas queixas e doenças apresentadas com agravos do trabalho. Mesmo sabendo que trabalhei com o braço gessado por mais de seis meses em mesas altas, cadeiras inadequadas e com problemas na iluminação e temperatura. Mesmo podendo observar no prontuário do médico Quintanilha, a evolução das queixas e dos membros afetados. Mesmo relacionando minhas doenças: “tenossinovite de ombro esquerdo”       (note-se que trabalhei com braço gessado); “tendinite de perna direita” (laudo ergonômico aponta cadeiras sem ajuste de altura e apoio para os braços, assentos inclinados para trás, falta de apoio para os pés, falta de espaço para as pernas); “bursite nos ombros” (datilografava em mesas  muito altas, sem possibilidade de apoio para os antebraços); “dor cervical, dor lombar, dores nos membros inferiores, nas coxas e região glútea; dores no pescoço, de cabeça, tonturas ao deitar e pseudoartrose cubital (decorrente de fratura em 1994)”.40
Um dos tipos de LER/DORT, a tenossinovite, atinge a classe de trabalhadores que utilizam movimentos repetitivos das mãos, como por exemplo, digitadores, caixas, datilógrafos, pianistas, tricoteiras, jornalistas. As tendinites e as bursites também estão relacionadas como doença ocupacional e são responsáveis pela alteração de diversas estruturas como tendões, sinóvias, músculos, nervos, etc. O problema é provocado comumente por movimentos repetitivos, má postura, enfim, pelo uso excessivo do sistema músculo-esquelético. Paulo Gonzaga relacionou doenças ocupacionais, atestadas inclusive por outros peritos do INSS, mas focou sua atenção somente sobre meu estado emocional – que também era proveniente do meu ambiente laboral, mas não reconhecido pelo perito.
O trabalhador vitimado por acidente do trabalho, incluindo-se aí as incapacitações físicas e/ou de ordem psicológica, já tinha direito, em 1999, ao recebimento do benefício acidentário (B91) e não simplesmente ao benefício auxílio-doença comum (B31). Entretanto, era prática do INSS  a concessão do mero auxílio-doença (B31), acarretando graves prejuízos ao segurado.
O site da Assessoria de Comunicação (ACS) da Universidade de Brasília (UnB) traz matéria de Carolina Valadares (http://www.secom.unb.br/unbnoticias/un0507-p7.htm) em que há um alerta de que a “não caracterização da doença ocupacional gera um conflito enorme entre os médicos comuns (da medicina assistencial) e os médicos peritos. Estes, ainda que os pacientes levem diagnósticos atestando impossibilidade para trabalhar, não reconhecem as doenças ocupacionais. Com isso, geram auxílios-doença comuns (previdenciários) ao invés de acidentários”.
Na matéria, Carolina coloca o posicionamento do Coordenador da Área Técnica de Saúde do Trabalhador do Ministério da Saúde, Marco Antônio Pérez. Segundo ele, “um dos aspectos que pode gerar essas discrepâncias é o fato de os médicos não serem capacitados adequadamente para fazer diagnóstico de doenças ocupacionais”. A matéria também transcreve a opinião da médica Regina Viriato, com consultório na Diretoria de Saúde do Trabalhador (DISAT) da Secretaria de Saúde do Distrito Federal, em Brasília. A médica enfatiza que “no Brasil, uma especialização em saúde do trabalho dura cerca de um ano, com 300 horas de duração e somente nos finais de semana; enquanto isso, na Itália, a residência médica nessa área dura quatro anos, em média, com oito horas diárias de prática”.
A reportagem mostra que, embora não haja diferença na remuneração entre o auxílio-doença acidentário e o auxílio-doença comum, já que ambos têm o mesmo valor monetário, o auxílio-acidentário  garante a estabilidade no emprego por um ano e os depósitos no FGTS. Ademais, abre uma porta para que o trabalhador possa entrar na Justiça com ações de pedidos  indenizatórios por danos materiais e morais.

Nasci sob o signo de Libra, e minha busca pela justiça é incessante. Após a negativa do perito Paulo Gonzaga entrei com recurso na 18a Junta de Recursos da Previdência Social – JRPS, em busca do nexo entre minha doença e o meu local de trabalho. Fui informada de que a entidade é um colegiado, composto por representantes do governo, dos empregadores e dos trabalhadores, com o objetivo de julgar os processos com total isenção.  Não foi o que observei, visto que a JRPS também negou o nexo com o fundamento de que “dois peritos do INSS já haviam negado”. Além disso, também observei equívocos no entendimento do meu pedido, que permaneceram mesmo eu tendo solicitado a reformulação.
Fiz novo pedido de análise cuja  decisão ficou a cargo de um Colegiado que se reuniu no dia 16/07/01 para a sessão n0 0201/2001, às 14horas. O acórdão 06356/2001, assinado pelo presidente da JR, Antônio Dantas Padilha, foi o seguinte: “Vistos e relatados os presentes autos em sessão realizada hoje, ACORDAM os Conselheiros da 18ª Junta de Recursos, por unanimidade, em CONHECER do RECURSO e NEGAR-LHE PROVIMENTO, de acordo com o relatório e Voto do Relator”.
No relatório, o representante dos trabalhadores, Alberto Glina, relata: “Leni Beatriz Schmitz recorre a esta 18a JR, contra o indeferimento pelo Órgão de Origem de seu requerimento de concessão de auxílio doença em aposentadoria por invalidez, pedido formulado em 23/09/1998 (...)”.
Não pedi transformação de beneficio em aposentadoria por invalidez!
O relator continua: “Em seu recurso de reconsideração (...) em apertada síntese, a recorrente se insurge contra a transformação pretendida e o não estabelecimento do nexo técnico a possibilitar a mudança do benefício. Mantido o indeferimento, vieram aos autos a este Colegiado, após a realização das diligenciais determinadas através de fls. 128 e 133”.
A providência solicitada à fl. 133, determinando que a segurada  fosse examinada por uma junta médica, não foi atendida. Não ocorreu esse exame. Mesmo com esses erros, a Junta nega provimento ao recurso.   

Outro perito que negou o nexo foi o médico Alexandre A. Messias, através do laudo transcrito abaixo:

1. leni beatriz schmitz, B31/103.588.102-8, solicita a transformação de seu auxílio-doença em benefício acidentário (B91).
2.  A segurada é jornalista, trabalhando desde 1986 no Jornal do Comércio de Porto Alegre, onde alega ter exercido função insalubre, inclusive anexando ao processo um completo laudo de análise ergonômica de seu local de trabalho, que dá peso à sua reivindicação. Ajuntado ao processo, cópia do prontuário médico da paciente na Clínica Dr. Quintanilha dá conta dos diversos diagnósticos feitos na segurada, a partir de 21/03/88 (página 13), todos já amplamente apresentados e discutidos, todos citados na lista de doenças causadas por esforços repetitivos, ou por atividades em posição fixa. Contudo, na leitura minuciosa do referido prontuário, encontro: A) página 11 do processo, evolução de consulta realizada em 24/11/88 “As dores iniciaram desde a adolescência. Pioraram após a 1a gestação (...)” e, mais adiante na mesma página “Fez RX - desvio na coluna”. Neste ponto devo fazer uma ressalva: não se consegue ler perfeitamente a palavra que, suponho, seja adolescência, mas o restante está bastante claro. B) página 13, verso, evolução de 09/04/92 lê-se “há 20 anos dores”.
3.  O diagnóstico de LER/DORT deve ser fundamentado na anamnese ocupacional, caracterizando-se o gesto laborativo com esforço repetitivo ou em posição fixa como causador da síndrome dolorosa que se nos apresenta, excluindo-se outros fatores etiológicos, como dupla jornada, stress, inadequação ao trabalho e patologias associadas. O nexo causal não deve ser dado em caso de dúvida.
4. A segurada Leni Beatriz Schmitz apresenta queixas de dor há muito tempo, “desde a adolescência” ou “há 20 anos”, havendo referência, inclusive, a “desvio de coluna”. Neste caso, há doença pré-existente ao quadro descrito a partir de 1988, tendo havido agravamento posterior ao ingresso na função exercida, não cabendo a transformação do B31/103.588.102-8 em B 91.
5.  Retorne a 19-710.0, em prosseguimento.
Bibliografia:

A) almeida, i.m..Dificuldades no diagnóstico de doenças ocupacionais e do trabalho. JBM 74 (1/2): 35-48, Jan/Fev 1998.
B) Fonseca, A.G..Lesões por esforço repetitivo. O grande desafio para o ortopedista ocupacional JBM 74(1/2):14-28, Jan/Fev 1998.
***************  
Apesar de o médico Alexandre Messias validar que foi anexado ao processo um completo laudo de análise ergonômica de meu local de trabalho, “que dá peso à reivindicação”, e ainda diagnósticos de doença profissional, “todos citados na lista de doenças causadas por esforços repetitivos, ou por atividades em posição fixa”, pinçou apenas informações que lhe interessavam da primeira consulta que tive na Clínica Dr. Quintanilha, para negar o nexo: “dores desde a adolescência e desvio na coluna; há 20 anos dores e pioraram após a primeira gestação”.
1. Realmente, quando o médico perguntou desde quando eu lembrava sentir dor, respondi: “Desde a adolescência”. 
Eu estava me referindo a dores de um modo geral, como dor de cabeça, cólica, dor de estômago e outras.  A comunidade médica sabe que a migrânea (cefaléia) é frequente já na primeira década de vida. “Cerca de 20% dos adultos migranosos referem que suas cefaléias iniciaram antes dos 10 anos de idade (PRENSKY, 1976). Sua prevalência na infância e adolescência varia de 2,7 a 22% (RAFFAELLI, 2002). Um estudo realizado com crianças e adolescentes de Porto Alegre evidenciou prevalência de migrânea de 9,9%, sem diferença entre os sexos (Barea et al, 1996)”, segundo informação contida no site http://www.drashirleydecampos. com.br/noticias/22121.
 2. A dismenorreia é a menstruação dolorosa acompanhada ou não de manifestações gerais, estando presente algum desconforto em quase todas as mulheres. Sofri muito com essas dores na minha adolescência.
3. “As dores pioraram após primeira gestação.” É verdade. A dor de cabeça, dor lombar, cervical, dorsal, dos membros inferiores e superiores pioraram após a primeira gestação. Atente-se: eu falei primeira gestação, e não após o primeiro parto. Minha primeira gestação ocorreu em 1978/79, quando eu trabalhava no Jornal do Comércio, em local inadequado ergonomicamente. Trabalhei até um dia antes do parto. E sentia muitas dores.
4. “Há 20 anos dores.” Nasci em 1946. Em novembro de 1988, eu estava com 42 anos de idade. Então, minhas dores teriam iniciado aos 22 anos? Mas havia falado que as dores iniciaram na adolescência, que na minha compreensão seria aos 12 ou 13 anos, quando menstruei pela primeira vez e começaram as cólicas e enxaqueca. Se o perito tivesse feito esse cálculo, teria constatado que as informações não eram precisas. Deveria ter me questionado para maior esclarecimento.
5. “Desvio na coluna.” Disse ao médico Quintanilha que havia feito um RX há muito tempo e não lembrava do resultado, se havia algum desvio ou não. Mas nos RX que fiz pelo INSS, no período do benefício, não apareceu esse diagnóstico.
6. Dado importante da primeira consulta e descartada pelo perito Messias foi a informação: “Nega incapacidade física temporária ou definitiva”.
7. A  incapacidade foi se apresentando com o decorrer do tempo e do agravamento da doença ocupacional, como comprovam os demais registros do médico Quintanilha, médicos do trabalho e também de peritos do INSS.
8. Tanto que o laudo conclusivo para minha aposentadoria por invalidez, requerido por outro perito do INSS, refere os diagnósticos de tendinite, bursite em ombro, síndrome do túnel do carpo; apresentando severa limitação nos membros superiores e com um quadro álgico intenso. O laudo conclui que há “incapacidade e limitação física de imprimir ritmo e continuidade em tarefas a executar. E, principalmente, problemas de ordem emocionais experimentados através de forte sentimento de perda pela incapacidade gerada por sua limitação laborativa, insegurança, dependência e dor física constante”.

 A interpretação do perito Paulo Gonzaga em relação aos meus problemas de ordem emocional foi completamente antagônica a essa última que me pareceu  acertada. Para o perito Paulo Gonzaga todo meu problema  emocional estava relacionado à minha separação,  e não à minha doença. Naquela época, LER, nexo e doença ocupacional eram palavras proibidas pelo INSS. Pelo visto, a JRPS seguia a mesma orientação.

  NOTA: 32, 33, 34 e 38 entenda-se por "Roberto". Renato é irmão de Roberto. 

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“É preciso entender que as leis servem apenas para orientar a nossa convivência, como sociedade. Mas nosso comportamento como pessoas depende de nossos valores, do uso de nosso discernimento e da nossa liberdade. Não dependemos de governos, partidos e líderes para sermos honestos e verdadeiros. Os valores morais é que nos mostram o caminho do bem e da verdade, são eles que impedem o ser humano de praticar atos ilícitos. Quando não são importantes na vida das pessoas, não há sistema que impeça um lamaçal de corrupção e de maldades.

Caráter, consciência, amor à verdade e ao próximo, generosidade, fidelidade, responsabilidade, respeito ao alheio, senso de justiça, são essas as virtudes que comandam a vida pública. Abandoná-las é decisão pessoal. Toda culpa é pessoal. Ela é decorrente do mau uso da liberdade. A culpa é tão intransferível quanto as virtudes. Nossa luta é convencer nosso povo a se comportar de acordo com essa visão ética. Por isso devemos sempre querer que os culpados sejam punidos.” (Sandra Cavalcanti, professora e jornalista, foi deputada federal constituinte.- O Estado de S.Paulo)

http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,os-culpados--devem-ser-punidos-,798388,0.htm