“É livre a manifestação do pensamento e da expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, sendo vedado o anonimato. (CF 88).”

quarta-feira, 5 de março de 2008


Dano moral trabalhista
Juliana Mendanha Ribeiro


1 INTRODUÇAO

Neste trabalho falaremos sobre alguns aspectos do dano moral trabalhista, suas causas, consequências, formas de evitá-lo, procurando demonstrar alguns dos acontecimentos que podem ocasionar o pedido de ressarcimento por este tipo de dano.
No primeiro capítulo iremos tratar sobre a relação de emprego, sua formação, características, seus sujeitos, diferenciações. Buscando primeiramente mostrar quem são as pessoas que podem figurar no pólo passivo e ativo de uma demanda envolvendo dano moral trabalhista.

Posteriormente, no segundo capítulo faremos um esboço histórico falando sobre o surgimento do sistema de reparação, mostrando sua evolução no contexto mundial e depois retrataremos esta mesma evolução no Direito Brasileiro, abordando a responsabilidade civil e o ressarcimento. Neste mesmo capitulo será conceituado o que vem a ser dano moral.

Depois disso, no quarto capítulo entraremos especificamente no dano moral trabalhista, fazendo sua conceituação, abordando suas características, fases e competência.

No quinto capitulo falaremos sobre o dano moral que pode ser causado pelo assédio moral, problema social que afeta inúmeros empregados com consequências desastrosas para sua vida familiar, econômica e psicológica.

Já no sexto capitulo mencionaremos sobre o dano moral e assédio sexual, bastante comum nas relações de emprego apesar de sua gravidade, pois antes de tudo trata-se de um crime, já que fere a integridade moral da vítima.

Para finalizar os exemplos de atitudes que podem gerar um dano moral trabalhista iremos expor sobre dano moral e acidente de trabalho, procurando demonstrar que o empregador deve zelar pela integridade física de seus funcionários seja com o fornecimento de equipamentos de segurança individual, seja com orientações, cursos de segurança, sob pena de ser responsabilizado pela ocorrência de acidente de trabalho, tendo a obrigação de ressarcir o funcionário por este dano moral. Sem mencionar as outras consequências possíveis, como responder a um processo criminal seja pela forma culposa ou dolosa.

Esperamos com este trabalho contribuir, mesmo que de modo singelo, para um maior esclarecimento deste tema tão debatido atualmente, mas que ainda precisa ser melhor discutido, para que possamos adequar nossa legislação trabalhista para a realidade de que no ambiente de trabalho temos vários fatores geradores de danos morais. Isto deve ser modificado, no intuito principalmente de prevenir a ocorrência deste tipo de dano, que interfere em nossa vida profissional, familiar e social.

2. RELAÇÃO DE EMPREGO

2.1. CONCEITO

É o vinculo de obrigações existentes entre o trabalhador e o empregador. O que caracteriza a relação de emprego é principalmente a dependência do trabalhador diante ao empregador. Esse vínculo de dependência, subordinação distingue a relação de emprego de outras relações de trabalho.

Isto quer dizer que o trabalhador empregado é dirigido por outrem: o empregador. Se isto não ocorre, não podemos falar em empregado, mas em autônomo ou outro tipo de trabalhador. Temos que observar que a subordinação coloca o empregado em uma posição hierárquica inferior, na qual depende das ordens, da fiscalização e direção para executar suas tarefas. 1

Diante disso, na relação de emprego, é necessário proteger o trabalhador com uma superioridade jurídica, a fim de compensar sua inferioridade econômica em relação ao empregador.

2.2. Sujeitos da Relação de Emprego

2.2.1 Empregado

A CLT em seu art.3º esclarece de forma precisa o conceito de empregado: "considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviço de natureza não eventual a empregador, sob dependência deste e mediante salário".

O primeiro requisito para ser empregado é ser pessoa física. Não é considerado empregado animal ou pessoa jurídica.

O segundo requisito é que o serviço prestado pelo empregado deve ser de natureza contínua, não pode ser episódico, ocasional. No contrato de trabalho, há a habitualidade na prestação dos serviços, não podemos confundir com cotidiano, diário, basta apenas que seja contínuo, sucessivo, não se exaure numa única prestação. 2

A terceira característica é a dependência, melhor dizendo a subordinação para o empregado e poder de direção, comando para o empregador.

O contrato de trabalho não é gratuito, sempre tem que ser oneroso, sendo assim necessariamente o empregado irá receber salários pela prestação de serviços ao empregador. Logo, a prestação de serviço gratuita desconfigura a relação de emprego, temos como exemplo o padre que apesar de estar subordinado à Igreja, não recebe nenhum valor pelo que faz.

A prestação de serviços deve ser feita com pessoalidade. O contrato de trabalho é realizado com certa pessoa, daí dizer que é intuito personae. O empregado não pode se fazer substituir por outra pessoa, sob pena de inexistir o elemento pessoalidade na referida relação.

Cumpre observar que a CLT não exige como requisito à configuração da relação de emprego que o empregado preste serviços no próprio estabelecimento do empregador, tanto que é muito comum as grandes empresas permitirem que seus funcionários prestem serviços em suas próprias residências.

2.2.2 Empregador

O art.2º da CLT considera empregador "a empresa, individual ou coletiva, que assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços". Podem também ser empregadores os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como empregados.

A empresa é a atividade organizada para a produção de bens e serviços para o mercado, com o objetivo de lucro. No entanto, temos como exceção as associações beneficentes, que também são consideradas empregadores.

Convém fazermos duas diferenciações importantes. A empresa não se confunde com estabelecimento, pois este último é apenas o lugar onde o empresário exerce suas atividades, compreendendo as instalações, máquinas, equipamentos. Outra diferença é que a empresa distingue-se da pessoa de seu proprietário, pois ela é uma instituição, uma pessoa jurídica, feita para perdurar no tempo, enquanto o proprietário não tem tempo de vida limitado, por isso não se exige pessoalidade do empregador, ele pode ser substituído.

Vale ressaltar, que não é requisito para ser empregador ter personalidade jurídica, pois temos como empregadores a sociedade de fato, a sociedade irregular, o condomínio, a pessoa física e o profissional autônomo.

Outras pessoas também poderão ser empregadores, como União, Estados-membros, municípios, autarquias, fundações, massa falida, espólio, empresa pública, sociedade de economia mista.

Enfim, para ser empregador, de modo bem simplificado, podemos dizer que é quem tem empregados.

3. BREVE ESBOÇO HISTÓRICO

Nos primórdios da civilização, o homem se defendia das agressões sofridas com suas próprias forças, utilizando-se de um sentimento de vingança, a justiça era feita pela vítima.

Esta situação foi sendo modificada à medida que os povos foram se organizando politicamente, transferindo poderes para o Estado, que passou a ser o responsável pela realização da justiça, decidindo em nome da harmonia social, os crimes, as penalidades.

Neste processo de evolução, podemos citar algumas legislações que procuraram disciplinar o dano e sua reparação:

- Código de Hamurabi: tratou da reparação do dano de duas formas distintas, as ofensas pessoais puderam ser reparadas mediante ofensa equânime a ser dirigida ao ofensor, mas, paralelamente, existia a possibilidade de reparação do dano à custo de pagamento de valor pecuniário3. Temos neste período o estimulo à vingança perpetrada na máxima do "olho por olho, dente por dente", mas também já temos a previsão de indenizações consistente em valor monetário da época.

- Código de Manu: O rei impunha as penalidades previstas neste código. É o caso, por exemplo, do parágrafo 224, no qual o rei ficava autorizado a impor pesada multa àquele que desse em casamento ‘donzela com defeitos, sem antes haver prevenido o interessado 4.

- Lei das XII Tábuas: No sistema romano a reparação se impunha, não se importando com o motivo que havia se dado a lesão, bastava comprovar a ocorrência do dano, uma verdadeira responsabilidade objetiva. Caberia ao Estado-juiz delimitar a quantia a ser paga como indenização. 5

Pode-se concluir que evoluímos do sistema de vingança, para o de reparação do dano, através da intermediação do Estado-Juiz, obrigando a vítima a aceitar a composição e decisão judicial.

3.1. Dano Moral no Direito Brasileiro

O Decreto-lei n°2.681, de 7 de dezembro de 1912, é o marco histórico do reconhecimento do dano moral no direito brasileiro, pois regulava a responsabilidade civil das estradas de ferro no Brasil, no que diz respeito ao transporte de mercadorias e passageiros, bem como suas bagagens. Entretanto, pela sua importância acabou tendo sua aplicação estendida pelos tribunais a todas as questões relacionadas com atividades de transportes.

O Código Civil Brasileiro de 1916 possuía diversos dispositivos utilizados pelos doutrinadores para embasar pedidos de indenização por danos morais, podemos citar como exemplo seu art.76:

Para propor ou contestar uma ação, é necessário ter legítimo interesse econômico ou moral.
Parágrafo único. O interesse moral só autoriza a ação quando toque diretamente ao autor, ou à sua família".
Posteriormente, tivemos o Código Brasileiro de Telecomunicações, que em seus artigos 81 a 88, admitia claramente a indenização por danos morais:

"Art.81- Independentemente de ação penal, o ofendido pela calúnia, difamação ou injúria, cometida por meio de radiodifusão, poderá demandar, no juízo cível, a reparação por dano moral."

A Lei de Imprensa também veio regular a manifestação do pensamento e de informação, deixando claro em seu art. 49:

"Aquele que no exercício da liberdade de manifestação de pensamento e de informação, com dolo ou culpa, viola direito, ou causa prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar."

O art.5°, inciso V, da Carta Magna dispõe:

"É assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem", e no inciso X do mesmo artigo, que "são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação."

O Código Civil atual estabeleceu as diretrizes necessárias para que seja cumprido o que determina o texto constitucional, pois possibilita, ainda que não hajam prejuízos materiais, a reparação de dano exclusivamente moral, seguindo a tendência doutrinária e jurisprudencial, conforme se verifica no seu artigo 186, que afirma:

"Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito".

Com relação à jurisprudência brasileira, podemos dizer que antes da Constituição de 1988, ela era de forma ampla e majoritária contrária ao reconhecimento do dano moral puro. "Houve três estágios: num primeiro momento a negativa era total; depois se passou a aceitar a indenização, porém condicionada a determinados eventos, e, finalmente, a tese passou a ter uma maior aceitação 6".

Ao contrário da jurisprudência, a doutrina brasileira era majoritariamente a favor da indenização dos danos decorrentes de qualquer lesão aos bens imateriais, tais como, à honra, à personalidade, à imagem.

Podemos perceber que embora se situando no campo da responsabilidade civil, a reparação do dano moral encontra no Direito do Trabalho amplo desenvolvimento.

O autor Luiz de Pinho Pedreira, sobre esta questão, afirma que: "Se em algum âmbito de Direito o conceito de dano moral pode ter alguma aplicação, é, precisamente, no do trabalho. A razão da subordinação a que está sujeito o trabalhador na satisfação do seu débito leva que a atuação da outra parte, que dirige essa atividade humana, possa menoscabar a faculdade de autuar que diminui ou até frustra totalmente a satisfação de um interesse não patrimonial7".

O crescente aumento de demandas nos tribunais brasileiros, bem como, a gama de estudiosos sobre o dano moral trabalhista, têm demonstrado o quanto este assunto já ganhou espaço no Direito do Trabalho e por certo esse espaço será muito maior com o tempo.

3.2. Conceito dano moral

Segundo a doutrinadora Maria Helena Diniz: "O dano moral vem a ser a lesão de interesses não patrimoniais de pessoa física ou jurídica, provocada pelo fato lesivo 8."

Podemos notar que o dano moral vem a ser a lesão a um interesse jurídico extra- patrimonial relacionado aos direitos da personalidade (vida, liberdade, honra) ou aos atributos da pessoa (nome, capacidade). Sendo assim, poderíamos chamá-lo de dano imaterial, pois atinge valores personalíssimos.

Valdir Florindo, um dos autores que mais se debruçou sobre o tema e, como ele próprio afirma, valendo-se dos ensinamentos dos grandes autores, definiu o dano moral como aquele decorrente de lesão à honra, à dor-sentimento ou física, aquele que afeta a paz interior do ser humano, enfim, ofensa que cause mal, com fortes abalos na personalidade do indivíduo, e acrescenta ainda que, "pode-se dizer com segurança que seu caráter é extra patrimonial, contudo é inegável seu reflexo sobre o patrimônio. A verdade é que podemos ser lesado no que somos e não tão somente no que temos9".

Para Francisco Antonio de Oliveira, o dano moral é aquele que atinge bens incorpóreos como a autoestima, a honra, a privacidade, a imagem, o nome, a dor, o espanto, a emoção, a vergonha, a injúria física ou moral, a sensação de dor, de angustia, de perda. O dano moral firma residência em sede psíquica e sensorial. Daí a impossibilidade de medi-lo objetivamente para fins indenizatórios. 10

Após examinar a configuração do dando moral no plano ilícito, Humberto Theodoro Júnior, afirma que "De maneira mais ampla, pode-se afirmar que são danos morais os ocorridos na esfera da subjetividade, ou no plano valorativo da pessoa na sociedade, alcançando os aspectos mais íntimos da personalidade humana11".

Para a caracterização do dano moral, não basta que ocorra qualquer dissabor ou contrariedade, pois estes são inerentes ao nosso cotidiano. Agora, tarefa nada fácil é saber separar frente ao caso concreto o que é uma simples chateação corriqueira de um real dano moral, já que está questão não é definida objetivamente nas leis. Temos que usar, principalmente, o bom senso, juntamente com a doutrina e jurisprudência para definirmos caso a caso se houve realmente lesão aos direitos inerentes à dignidade humana. Serão utilizados também estes critérios para definir a fixação do valor indenizatório, pois é claro que o juiz também deverá se pautar no grau de culpa do ofensor, as condições sociais e econômicas das partes envolvidas, a repercussão do ato lesivo ao meio social, de tal forma que a indenização não seja tão grande que leve o ofensor à ruína, nem seja tão pequena que avilte a vítima.

Outra questão que se mostra um pouco complicada refere-se à necessidade ou não de prova do dano moral. Autores de renome têm afirmado que o dano moral, por tratar-se de lesão ao íntimo das pessoas, dispensa a necessidade de prova. Entendimento este corroborado com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que entende não ser necessário provar o dano moral e sim demonstrar a ocorrência do fato que gerou a dor, sofrimento ou mesmo exposição indevida na mídia, agressão à honra, violação da intimidade e da privacidade.

Este entendimento segue a lógica, pois como conseguiríamos comprovar a repercussão no íntimo do ofendido, temos neste caso que usar a presunção de que qualquer indivíduo de sensibilidade mediana se sentiria agredido em seus direitos íntimos diante de determinada situação.

Quanto à reparação, vale salientar o pensamento do magistrado José Luiz Gavião de Almeida:

"A reparação dos danos morais não busca reconduzir as partes à situação anterior ao dano, meta impossível. A sentença visa a deixar claro que a honra, o bom nome e a reputação da vítima restaram lesionados pela atitude inconseqüente do causador do dano. Busca resgatar o bom conceito de que valia o ofendido no seio da sociedade. O que interessa de fato, é que a sentença venha declarar a idoneidade do lesado; proporcionar um reconforto à vítima, e, ainda, punir aquele que agiu, negligente, expondo o lesado a toda sorte de dissabores.12".

Neste mesmo sentido, defende Martinho Garcez Neto que a função penal da condenação por dano moral, pode e deve ser encarada como algo altamente moralizador, na medida que, atingindo o patrimônio do agressor com sua consequente diminuição, estaria, frente à luz moral e da equidade, cumprindo a mais elementar noção de justiça: estar-se-ia punindo o ofensor para que o bem moral seja respeitado e, mais importante, fazendo calar o sentimento de vingança do ofendido, sentimento este inato em qualquer pessoa, por mais moderno e civilizado que possa ser.13

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“É preciso entender que as leis servem apenas para orientar a nossa convivência, como sociedade. Mas nosso comportamento como pessoas depende de nossos valores, do uso de nosso discernimento e da nossa liberdade. Não dependemos de governos, partidos e líderes para sermos honestos e verdadeiros. Os valores morais é que nos mostram o caminho do bem e da verdade, são eles que impedem o ser humano de praticar atos ilícitos. Quando não são importantes na vida das pessoas, não há sistema que impeça um lamaçal de corrupção e de maldades.

Caráter, consciência, amor à verdade e ao próximo, generosidade, fidelidade, responsabilidade, respeito ao alheio, senso de justiça, são essas as virtudes que comandam a vida pública. Abandoná-las é decisão pessoal. Toda culpa é pessoal. Ela é decorrente do mau uso da liberdade. A culpa é tão intransferível quanto as virtudes. Nossa luta é convencer nosso povo a se comportar de acordo com essa visão ética. Por isso devemos sempre querer que os culpados sejam punidos.” (Sandra Cavalcanti, professora e jornalista, foi deputada federal constituinte.- O Estado de S.Paulo)

http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,os-culpados--devem-ser-punidos-,798388,0.htm